Você 
                sabe o que é Palíndromo?
                (por Rômulo Marinho - romulotmarinho@terra.com.br)
                
                Denominam-se assim palavras, frases 
                ou números que permanecem iguais quando se lê no sentido oposto. 
                São conhecidos, ainda, entre outras denominações, como "anacíclico", 
                "verso anacíclico" ou "verso palíndromo". Número com essa característica 
                é, também, chamado de capicua. Assim, numericamente falando, palíndromo 
                seria o gênero e capicua a espécie.
                
                Não sei se você já observou que certas palavras e números, lidos 
                inversamente, dão no mesmo, como, por exemplo, ANILINA, MERECEREM, 
                1001, 2002. 
                
                Pois bem, são palavras e números com essa   característica que 
                chamamos palíndromo. Os citados   são naturais, uma vez que existem 
                sem que alguém os   tenha criado com intuito palindrômico. Nasceram 
                  quando as palavras foram inventadas.
                
                O objeto primordial desse texto, contudo, são os   artificiais, 
                isto é, frases elaboradas com esse   propósito. À feitura desse 
                tipo de verso, no Brasil,   dá-se o nome de palindromia (Malba 
                Tahan, in   "Matemática recreativa"). Nos dicionários e   enciclopédias, 
                entretanto, a palavra só aparece com   um dos seus significados, 
                ou seja, "recaída de uma   doença".
                
                Paralelamente aos termos palindrômicos, correm as   palavras parapalindrômicas. 
                São aquelas que lidas ao   contrário, formam vocábulos diversos, 
                como, por   exemplo, SOMAR, MARROCOS, AMOR, etc. Palavras assim 
                  são muito úteis para criação dos palíndromos   artificiais. 
                
                
                O palíndromo artificial se faz, pelo menos, com duas   palavras 
                e se divide em duas partes: uma com sentido   natural e outra 
                inverso. Vejamos exemplos: primeiro,   um com apenas duas palavras: 
                LIBÂNIO INÁBIL. Com   três: ATACA PACA PACATA. Com quatro: O MÍSSIL 
                É   BELÍSSIMO. Com mais de quatro: O TEU DRAMA É AMAR   DUETO. 
                Tomando apenas esse último para exemplficar,   temos que nele 
                o sentido natural é "O TEU DRAMA".   Inverso: "AMAR DUETO".
                
                Às palavras que se encontram no centro do   palíndromo, como o 
                "É" do último, dou a denominação   de "palavra-eixo", porquanto 
                se encaixam nos dois   sentidos.
                
                Outro modelo: SÓ COM O TIO SOMÁVAMOS OITO MOÇOS.   Natural: SÓ 
                COM O TIO. Inverso: OITO MOÇOS.   Palavra-eixo: SOMÁVAMOS. A palavra-eixo, 
                aliás, é   sempre um palíndromo natural. Tenha ela uma ou mais 
                  sílabas.
                
                Também pode haver "letra-eixo". São exemplos, nos   palíndromos 
                transcritos, o "O" de LIBÂNIO, o "C" de   PACA e o "B" de "BELÍSSIMO", 
                pois participam dos   dois sentidos da frase.
                
                Há, finalmente, palíndromo que não tem nem letra nem   palavra-eixo. 
                Exemplo: AMADA RAPARIGA AGIRA PARA   DAMA. Natural: AMADA RAPARIGA. 
                Inverso: AGIRA PARA   DAMA.
                
                Os palíndromos artificiais podem ser perfeitos ou   imperfeitos. 
                
                
                Os perfeitos são aqueles nos quais os sinais   ortográficos (diacríticos 
                ou de pontuação) não   oscilam de posição. Veja: O TEU DRAMA É 
                AMAR DUETO.   Observe que o acento agudo em ambas as leituras 
                cai   sempre na mesma letra.
                
                Já nos imperfeitos, como o segundo, SÓ COM O TIO   SOMÁVAMOS OITO 
                MOÇOS, a manutenção dos sinais na   mesma letra não é respeitada 
                e, como na hipótese,   eles podem até desaparecer.
                
                Repare: o acento agudo da palavra "SÓ" não existe na   parte inversa, 
                o de SOMÁVAMOS muda de posição quando   se lê da direita para 
                esquerda e o cê-cedilha, que   consta na parte inversa, não aparece 
                na natural.
                
                Além dos sinais ortográficos, letras e palavras   também podem 
                variar a formatação na leitura da   direita para a esquerda, isto 
                é, letras isoladas   podem ser incorporadas a palavras e estas 
                podem ser   desdobradas em dois ou mais vocábulos e/ou letras. 
                  Exatamente como ocorre com o palíndromo SÓ COM O TIO   SOMÁVAMOS 
                OITO MOÇOS.
                
                Penso, ainda, que eles podem ser classificados em   três categorias 
                (fazendo uma modesta homenagem ao   idioma que, durante séculos, 
                os divulgou pelo   mundo): "explicitus", "interpretabiles" e   
                "insensatus".
                
                Os "explicitus" trazem sempre mensagem direta, clara   e inteligível, 
                como, por exemplo: A DIVA EM ARGEL   ALEGRA-ME A VIDA.
                
                Com relação aos "interpretabiles", o leitor   necessita de pequeno 
                esforço intelectual para   entender o que quis dizer o autor. 
                Exemplo: A RITA,   SOBRE VOVÔ, VERBOS ATIRA.
                
                Os "insensatus" cuidam apenas de juntar letras ou   palavras que 
                formam frases sem qualquer sentido, mas   palíndrômicas: Eis um: 
                OLÉ! MARACUJÁ, CAJU CARAMELO   (todos os palíndromos transcritos 
                acima são de minha   autoria).
                
                No que me diz respeito, nunca me interessei muito   pela produção 
                de palíndromos sem sentido claro. Não   os admiro. Para não lhes 
                negar um mínimo de   qualidade, admito que alguns têm bela sonoridade, 
                o   que já é bastante para muitos.
                
                Já li, outrossim, de um obscuro dicionarista, com   indisfarçável 
                intenção de menosprezá-la, que a   palindromia seria uma atividade 
                intelectual pueril.
                
                Pois saiba: já li poemas, pequenos textos e até   livros escritos 
                por crianças, mas nunca conheci um   só palíndromo que seja de 
                origem infantil. Bem que   torço para que isso ocorra o mais rápido 
                possível.   Adoraria ver crianças brasileiras dedicando-se ao 
                  lazer palíndrômico. Brincando com as palavras.
                Ficariam bem mais afiados no nosso idioma. Ademais,   não seria 
                pelo fato de uma criança se interessar por   determinado jogo 
                que isso o definiria como uma   distração infantil. O xadrez, 
                por exemplo, é jogado   por milhões de crianças em quase todos 
                os países e   nem por isso é considerado um divertimento pueril. 
                
                
                Afinal, brincar com as palavras é o que os poetas   fazem, obstinada 
                e diariamente. Fernando Pessoa fez   delas a sua pátria. Ando 
                desconfiado de que é puro   despeito do dicionarista aquele falar. 
                
                Provavelmente, porque jamais conseguiu produzir um   mísero palíndromo 
                de duas palavras.
                
                Bem, exageros e frustrações à parte, entendem   alguns, entre 
                o quais me incluo, que a palindromia é   uma arte. Outros, uma 
                simples curiosidade literária.
                Uma ou outra, como queiram, penso que se trata de   uma das grandes 
                criações da inteligência eternamente   lúdica do homem, ainda 
                nos primórdios da nossa   civilização.
                
                Millôr Fernandes se filia à corrente dos que a   consideram uma 
                arte. Em crônica publicada no Jornal   do Brasil, afirma, enfaticamente, 
                que a palindromia   é uma "arte neurótica e maravilhosa, capaz 
                de   envergonhar qualquer concretismo". No mesma dia,   publicou 
                três palíndromos de sua lavra: A GRAMA   AMARGA/ ASSIM A AIA IA 
                À MISSA e A MALA NADA NA   LAMA.
                
                Juan Filloy, célebre autor argentino, adepto do   esoterismo, 
                que escreveu até os 105 anos de idade,   dizia que palíndromo 
                era o "divertimento dos gregos   cultos". Leão VI, imperador romano, 
                que não   conseguiu sequer chegar à marca de uma centena,(*)   
                afirmava tonitruantemente ser "campeão mundial de   palíndromos." 
                E prosseguia, orgulhosamente: "Olho as   palavras e logo sei se 
                são palindrômicas ou não;   tenho uma espécie de visão retrospectiva, 
                semelhante   à dos linotipista".
                
                O poeta francês Claude Gagnière afirmava, com   sabedoria: "para 
                os que amam as palavras, o   palíndromo representa uma espécie 
                de felicidade em   estado puro: é a frase espelho, a perfeição 
                na   simetria, ou a serpente que morde a própria cauda, o   ingresso 
                no círculo mágico dos vocábulos que não têm   fim". É exatamente 
                isso que penso e sinto. Quando   concluo algum que planejei, fico 
                extasiado, em   estado de graça.
                
                Leiam o que o Jornalista Sebastião Nery escreveu no   prefácio 
                do meu livro "Tucano na Cut", sobre   palíndromos:
                
                "In principio erat verbum". No começo era a palavra.   Está na 
                Bíblia e está na história do homem. O homem   é a palavra. A história 
                é a palavra. A história do   homem é a história da palavra. O 
                mistério de sua   linguagem. A magia de seu dizer."
                
                "Na Grécia livre de Péricles, a palavra era o   discurso. Na Judéia 
                oprimida de Cristo, a palavra   era a parábola. Na Idade Média 
                torturada de Galileu,   a palavra era o silêncio. No coração túmido 
                do homem   moderno, a palavra é a poesia. Por isso Rosnard, o 
                  poeta do amor e da morte, disse que "a palavra é a   única magia: 
                a alma é conduzida e regida pela   palavra " (La parole, Rosnard, 
                est la seule   magie:l'ame par la parole est conduite et regie 
                ").   
                Shakespeare buscava na palavra o tempo do tempo: "-   Que tempo 
                enorme uma palavra encerra! ". ("How long   time lies in a one 
                little world !")." 
                
                "Este livro é um poema à palavra, à magia e ao   mistério da palavra 
                (...} um estudo magistral sobre   uma das mais belas, sonoras 
                e cantantes palavras da   linguagem universal, o palíndromo."
                
                A invenção dessa arte é atribuída ao sátiro e   irônico poeta 
                grego Sótadas de Maronéia (viveu no   século III a. C). Conta 
                a lenda - já a publiquei com   mais detalhes em livro - que Sótades, 
                certo dia,   cometeu a imprudência de satirizar Ptolomeu II   
                Filadelfo (déspota de plantão da época), que mandou   matá-lo 
                cruelmente. Foi, ainda, inventor dos versos   sotádicos, que mantêm 
                o sentido original, mesmo   quando se troca a posição dos vocábulos. 
                
                
                Eles existem em quase todos idiomas.
                
                Em português, ROMA ME TEM AMOR, pelo menos   formalmente, é tido 
                como o mais antigo. Afinal, foi   o único dado como exemplo no 
                verbete palíndromo da   edição inaugural (1789) do primeiro dicionário 
                da   língua portuguesa publicado no Brasil, organizado   por Antônio 
                Morais da Silva. O mais conhecido,   porém, é SOCORRAM-ME, SUBI 
                NO ÔNIBUS EM MAROCOS.   Ambos, de autores desconhecidos, são meio 
                nonsense,   mas isso é cacoete da arte palindrômica, fato que 
                  levou Millôr, na crônica referida, a dizer que "os   palíndromos 
                de real valor - os sem truques, sem   "ampersand" (&) no meio, 
                e com significado preciso,   são raros".
                
                Malba Tahan, no livro "MATEMÁTICA RECREATIVA",   afirmou que o 
                palíndromo mais extenso do idioma   português seria: LUZA ROCELINA, 
                A NAMORADA DO   MANUEL, LEU NA "MODA DA ROMANA: "ANIL É COR AZUL" 
                  (58 letras). Ainda sem comprovação documental   suficiente, 
                já li que a autoria desse palíndromo é   atribuída ao poeta português 
                Bocage. 
                
                Hoje, entanto, o maior, considerando-se apenas os   que foram 
                publicados em livros, é de minha autoria:O   GAL. LENO ROCA, À 
                PORTA DA CIDADE, A PORTADOR RELATA   FATAL ERRO DA TROPA E DÁ 
                DICA DA TROPA A CORONEL   LAGO (83 letras). 
                
                Recentemente, produzi um bem maior, que ainda não   teve divulgação 
                em livro. Ele está, porém, exposto   no item "POESIA", das minhas 
                publicações nesta Usina   de Letras. É o maior palíndromo do idioma 
                português.   Com ele introduzi, também, uma novidade: é o   primeiro 
                do mundo que tem um título, tal como   acontece, aliás, com qualquer 
                criação literária.   Denominei-o "COISAS, BICHOS E GENTE" e, ao 
                lê-lo,   logo saberá a razão. Tem 478 letras e 173 palavras.   
                Vá conhecê-lo. Basta clicar, lá no alto ou embaixo   da página, 
                na legenda "veja outros textos deste   autor" que você chegará 
                lá. Recomendo-lhe, também, o   "PALÍNDROMO DO AMOR TOTAL", com 
                123 letras.
                
                Quando tomou conhecimento desse meu último   palíndromo citado, 
                Millôr Fernandes me enviou a   seguinte mensagem:
                
                Parabéns, Rômulo. Você já pegou um ingresso pra   esse hospício 
                cada vez mais estreito onde ficam os   que se intrometem com as 
                palavras, seus sentidos,   desafios e mistérios. Não tem volta. 
                Abracadabraço.   Abração. Millôr". 
                
                Pode ser um hospício, mas muito agradável, pois   tenho ótimas 
                companhias. Alguns gênios idiomáticos. 
                
                Considero a elaboração de palíndromos das mais   agradáveis distrações 
                intelectuais.
                
                O exercício habitual dessa arte teve seu esplendor,   como já 
                mencionei, durante a idade média. Inspirados   vates, como o francês 
                Appolinaire e o inglês Canden,   criaram alguns portadores de 
                denso lirismo.
                
                Vejamos, agora, como os dicionários definem   palíndromo. Quando 
                li o verbete do Aurélio, "frase   ou palavra que, ou se leia da 
                esquerda para a   direita, ou da direita para esquerda, têm o 
                mesmo   sentido" duvidei. "Mesmo sentido" como? Reli.   Procurei 
                em diversos dicionários e enciclopédias,   idem. Não acreditei 
                no que lia. Até no antigo   Houaiss (Delta Larrousse) igual. Outro 
                dia, na   televisão, o mestre Pasquale também entrou nessa dos 
                  dicionários e, definindo a palavra, registrou o tal   "mesmo 
                sentido".
                
                Ora, essa seria a definição dos versos sotádicos, ou   seja, os 
                que "lidos da esquerda para a direita ou   vice-versa têm o mesmo 
                sentido". Exemplo: "Felizes   todos chegaram", "Chegaram Todos 
                Felizes" ou "Todos   chegaram felizes". Nesses, não importa a 
                colocação   das palavras no texto: em qualquer direção que se 
                  leia, ai sim, o sentido é o mesmo.
                
                Com relação às palavras ou frases palindrômicas, não   há falar 
                em mesmo sentido. Estas, quando lidas à   maneira árabe, são idênticas. 
                Assim, a definição   correta me parece ser: palavra, frase ou 
                número que,   lidos da esquerda para direita ou vice-versa, são 
                  literalmente iguais. 
                
                Não obstante, segundo alguns historiadores, a   palindromia tenha 
                sido criada pelo grego Sótades,   Malba Tahan afirmava que os 
                mais conhecidos no mundo   são os latinos (no meu livro publico 
                nove). No   idioma helênico, entretanto, quando fiz minhas   pesquisas, 
                incluive na Embaixada daquele país no   Brasil e na Universidade 
                de Atenas, só encontrei um:   NIYON ANOMHMATA MH MONAN OYIN (lave 
                seus pecados,   não apenas suas mãos). Esse palíndromo aparece 
                nas   fachadas de algumas igrejas centenárias de países   europeus. 
                Sua criação é creditada ao papa Gregório   de Nazianzus (328/389 
                d.C.), mais tarde São   Gregório.
                
                Creio, porém, que, hoje, os mais famosos são os   produzidos em 
                inglês (tinha que ser, pois o império,   hoje, fala esse idioma), 
                sobressaindo-se o feito em   homenagem (dizem os escritores americanos) 
                a   Theodore Roosevelt (1858/1919), pela obra mais   importante 
                do seu governo, a construção do Canal do   Panamá: A MAN, A PLAN, 
                A CANAL: PANAMA. Millor   considera esse palíndromo excepcional. 
                
                
                Destaca-se entre os latinos, o mais antigo que se   tem notícia 
                com, aproximadamente, 2.000 anos: SATOR   AREPO TENET OPERA ROTAS, 
                Repito: "que se tem   notícia", porquanto o mais antigo seria, 
                certamente,   qualquer um criado por Sótades (III a.C.). Dele, 
                  porém, não há sequer um conhecido.
                
                O significado desse anacíclico, ainda hoje envolto   em mistério 
                e misticismo, ninguém sabe ao certo, se   é que, realmente, tem 
                algum (li, pelo menos, seis   traduções díspares).
                
                Em certas regiões do interior do Brasil (em meu   livro conto 
                versão de como teria chegado ao nosso   País), essas cinco palavras, 
                são tidas e havidas   como milagrosas, capazes de sarar diversos 
                males.   Costumam escrevê-las numa folha de papel, que   colocam 
                num saquinho de pano e o penduram no pescoço   do enfermo. Em 
                Minas esse suporte é denominado   "bentinho" e, na Bahia, "patoá". 
                Dizem que, para   curar picada de cobra, sarampo, catapora, etc., 
                é   tiro e queda.
                
                Esse remotíssimo palíndromo latino, também   denominado quadrado 
                mágico, possui característica   muito peculiar: dispostas as palavras 
                em linhas,   pode ser lido em todas as direções e o resultado 
                  será sempre o mesmo. Assim, além de palíndromo, é   acróstico 
                perfeito. Vejamos:
                
                S A T O R 
                A R E P O 
                T E N E T 
                O P E R A 
                R O T A S 
                
                Suas traduções, e são muitas, realizadas por   intelectuais brasileiros 
                e estrangeiros, além de   contraditórias, suscitaram, e ainda 
                suscitam,   intermináveis polêmicas. Conheço seis. Eis duas   
                delas: "Arepo, o semeador, segura as rodas durante o   trabalho". 
                "Sator, o pastor, tem suas obras   encaminhadas".
                
                Segundo o grande filólogo e folclorista brasileiro   João Ribeiro, 
                entretanto, as palavras que o compõem,   à exceção de TENET, não 
                querem dizer, absolutamente,   nada. São intraduzíveis. Para o 
                mestre patrício,   cuja versão considero a única com fundamento 
                  científico e, por isso, convincente, esse palíndromo   seria, 
                apenas, jogo onomástico criado a partir dos   nomes dos Três Reis 
                Magos (eis porque não pode ser   mais antigo que os produzidos 
                por Sótades, que viveu   séculos a.C.). Daí, presumo, a crendice 
                popular que   se eternizou em torno do mesmo. Em "Tucano na Cut?" 
                  transcrevo quase na íntegra o ensaio do mestre   Ribeiro.
                
                Justamente por causa dos mistérios que o cercam   (li-o, pela 
                primeira vez, numa coluna do saudoso   Otto Lara Rezende - O Globo, 
                13.07.86),   interessei-me pelo assunto. Desse momento à criação 
                  dos meus foi só questão de tempo. Já estava   contaminado pelo 
                vírus palindrômico. O primeiro   nasceu bem sucinto: A BASE DO 
                TETO DESABA. A partir   deste, os demais foram surgindo aos borbotões. 
                Hoje   tenho mais de 2002 (o número expresso é por   coerência 
                ao tema). Entre os que criei, segundo os   leitores, os mais interessantes 
                seriam os seguintes:
                
                ( A base do teto desaba.   
                ( A droga do dote é todo da gorda.  
                ( Laço bacana para panaca boçal.  
                ( Seco de raiva, coloco no colo caviar e doces   
                ( O teu drama é amar dueto.  
                ( O terrível é ele vir reto.   
                ( E até o Papa poeta é.  
                ( Tucano na CUT.  
                ( Reter e rever para prever e reter.  
                ( Em roda, tropa, após a sopa, à porta dorme.  
                ( Oto come doce seco de mocotó. 
                
                Esses palíndromos começaram a ser feitos sem que   soubesse como 
                terminariam ou que sentido teriam. Só   há pouco tempo, consegui 
                fazer alguns com mensagens   planejadas. Como esse, em homenagem 
                à música, meu   outro xodó, que me custou, pelo menos, dois anos 
                de   tentativas: MODO: SOM TIRAMOS; SOMAMOS SOM A   RITMOS... 
                O DOM.
                
                Vejamos, agora, algumas curiosidades que detectei   sobre o assunto. 
                
                
                Primeiro, uma informação: o palíndromo de que mais   gosto, em 
                português, certamente pela sua sonoridade   (experimente lê-lo 
                em voz alta; mania de   compositor), cuja autoria desconheço, 
                e que gostaria   de ter feito: A CARA RAJADA DA JARARACA.
                
                A seguir, as curiosidades. A palavra palindrômica   mais extensa 
                da nossa língua é o superlativo de   omisso, OMISSÍSSIMO, com 
                onze letras. A mais longa,   dentre os idiomas, com dezenove caracteres, 
                é a   finlandesa SAIPPUAKIVIKAUPPIAS, que significa   "vendedor 
                de soda cáustica".
                
                O verbo da língua portuguesa que contém maior   quantidade de 
                tempos palindrômicos é somar: SOMAMOS,   SOMÁVAMOS, SOMÁRAMOS 
                e SOMEMOS  
                
                Os vocábulos soco e sopapo, além de serem sinônimos,   no plural, 
                se transformam em palíndromos.
                
                A palavra radar é palindrômica em, pelo menos, sete   idiomas, 
                uma vez que, não obstante formada de quatro   termos da língua 
                inglesa (radio detecting and   ranging), foi adotada, também, 
                pelo português,   francês, espanhol, alemão, italiano e polonês.
                
                Há, ainda, palíndromo natural, inobstante frase, que   é pesada 
                ofensa pessoal. Foi criado por anônimo, em   momento de ira. Quando 
                lançou o vitupério,   certamente, não fazia a menor idéia de estar 
                  construindo curiosidade literária: "É a mãe!".
                
                IN GIRUM IMUS NOCTE ET CONSUMIMUR IGNI é o   anacíclico que considero 
                mais lírico entre todos que   li, em cerca de dez idiomas. Há 
                muita chance de ter   sido escrito, segundo o poeta Ivo Barroso, 
                por   Apolinário o Antigo, gramático e retórico grego   cristão 
                do séc. IV, inspirando-se, provavelmente,   nas mariposas que 
                voavam em torno de sua lanterna.   Tradução: giramos a noite e 
                somos consumidas pelo   fogo.
                
                O mais politicamente correto, para usar expressão em   voga, radicalmente 
                anti-tabagista, é da autoria do   humorista e palindromista americano 
                Marvin Terban:   CIGAR? TOSS IT IN A CAN, IT IS SO TRAGIC (charuto? 
                  Jogue-o no lixo, é muito trágico).
                
                O mais explícito, sucinto e objetivo, foi escrito em   alemão: 
                EIN ESEL LESE NIE (um burro não lê).
                
                Agora que já sabe o que é palíndromo, tente criar o seu; mas não 
                desanime se, eventualmente, nas primeiras tentativas, não conseguir 
                êxito. Verá, com o tempo, que é desafiadora porém agradável distração 
                intelectual. 
                
                
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