JORNALISMO 
                LITERÁRIO DE PRIMEIRA QUALIDADE
                (por José Aloise Bahia)
                 
              Dez conversas
                Diálogos pertinentes
                
                A palavra entrevista no jornalismo emerge como um fenômeno importante 
                de comunicação social. De acordo com Edgar Morin ela é um tipo 
                de intervenção, sempre orientada para a comunicação de informações. 
                Fora do campo da espetacularização, as entrevistas intentam para 
                a compreensão mais plena das pessoas e suas realizações. Num certo 
                sentido é um estudo permanente, humanístico e desbravador com 
                imperativos democráticos, e aponta uma interação a serviço da 
                construção do imaginário coletivo. No outro uma investigação histórica 
                sempre pertinente para os leigos e entendidos. Pode ainda referir-se 
                a um diálogo possível entre entrevistador e entrevistado, uma 
                colaboração no sentido de trazer à tona uma verdade ou parte dela, 
                regada pela emoção, temperada com clareza e servida pela razão 
                compreensiva. Transforma-se em conversas, bate-papos, depoimentos, 
                declarações, juízos de valores ou confissões. A entrevista é um 
                gênero direto e esclarecedor da modernidade, e o seu exercício 
                cultural e consciente, na atualidade, produzir livros que merecem 
                um espaço especial nas estantes das melhores bibliotecas. 
                
                É o caso da edição bilíngüe (português/espanhol) de Dez conversas: 
                diálogos com poetas contemporâneos (Gutenberg Editora, 2004), 
                de autoria do jornalista, professor e poeta mineiro Fabrício Marques, 
                doutor em literatura comparada (UFMG) e atual editor do Suplemento 
                Literário de Minas Gerais. Uma obra valiosa e ágil, plural e revigorante, 
                pautada pela qualidade de discernimento e esforço jornalístico 
                em compreender o atual panorama da poesia brasileira. As entrevistas 
                exclusivas foram feitas entre 1997 e 2003, e publicadas no jornal 
                O Tempo e Suplemento Literário de Minas Gerais. Uma nova rodada 
                foi feita com a maioria dos poetas durante o ano de 2003, garantindo 
                uma unidade editorial à publicação, rompendo com o ritmo factual 
                e efêmero do jornalismo diário. O prefácio é do prosador e poeta 
                Joca Reiners Terron, criador da Ciência do Acidente, um selo original 
                e independente, que lançou mais de trinta livros de escritores 
                diferentes. A tradução para o espanhol é da poeta Prisca Agustoni 
                e as fotos inéditas de Guilherme Bergamini.
                
                Trabalho de Fôlego - Nas 272 páginas (a primeira metade em português 
                e a outra em espanhol), Dez conversas registra de maneira multidisciplinar 
                o entendimento de dez escritores com diferentes projetos estéticos 
                em relação à poesia. Ao invés de amparar-se numa suposta segurança 
                das idéias recebidas ou no prestígio de alguns dos entrevistados, 
                pela indagação e descoberta o autor procura não só resgatar e 
                chamar a atenção para as suas biografias e obras que considera 
                importantes, como também se desdobra em decifrar nas interlocuções 
                os esclarecimentos relevantes, e se mantém numa posição firme 
                que lhe permite desafiar com o máximo de vigor a prática poética, 
                conservando o estilo de linguagem dos entrevistados. No seu modo 
                inquieto de entrevistar, Fabrício Marques parece ter em mente 
                o verso-postulado de Fernando Pessoa em Autobiografia (1931), 
                “O poeta é um fingidor”, uma metáfora dissimulada, 
                porém útil ao estabelecer como no próprio poema de Pessoa o que 
                se revela/oculta, guarda, aguarda para ser dito. Nesta esteira 
                caminha o livro. Com interrogações e proposições editadas numa 
                ordem progressiva onde o pensamento caminha com a imaginação. 
                Revelando com prazer e proveito declarações inéditas aos leitores, 
                mesmo que tenha que desconversar, mudar de ritmo, ser até meio 
                irreverente, para atingir a sua proposta principal: um texto mais 
                próximo da fala do que da palavra escrita. 
                
                No livro transitam bate-papos, afirmações, questionamentos veementes, 
                resgates, lembranças, confissões, convergências, nós e laços do 
                fazer poético. Cada autor, em suas concepções e tratos com a língua, 
                revelam experiências e histórias de vidas. Delimitam e ponderam 
                influências recebidas. Tecem comentários sobre situações, livros 
                e poemas escritos. Esmiúçam a relação escritor/leitor. Fazem um 
                retrospecto literário brasileiro do final da década de 1960 até 
                os últimos anos de 1990. Entendem-se com a tradição. Destacam 
                projetos da modernidade e contemporaneidade. Apontam tendências. 
                Discutem questões ligadas à tradução, crítica, estética, artes 
                plásticas, música, internete e virtudes do espírito. Falam sobre 
                a descoberta da poesia. Conversam sobre quase tudo, inclusive 
                o jornalismo e a mídia. Desconversam e dialogam sobre o reino 
                das palavras. Numa órbita lúcida e fecunda, desafiam a lei da 
                gravidade, conjugam inúmeros verbos, mudam de assunto, entretanto 
                se encontram no essencial: a vocação plena do ofício de poeta. 
                
                
                O mais impressionante no livro é a maneira sutil como o entrevistador 
                consegue, por meio de um delicado equilíbrio entre clareza e investigação, 
                organizar e comunicar o seu vasto conhecimento e os pensamentos 
                e repertórios literários de poetas diferentes. Com o fôlego da 
                liberdade pautada pela consciência da literatura comparada e a 
                experiência jornalística, Fabrício Marques entrelaça informações, 
                fatos, referências, livros e poemas. Constrói argumentos sólidos 
                e inventivos, para interpelar de maneira arguta os entrevistados 
                e provocar toda uma sucessão de epigramas, citações diversificadas, 
                críticas construtivas, análises polêmicas e reflexões pertinentes. 
                
                
                Os Entrevistados de A a Z - A seleção dos escolhidos contém poetas 
                consagrados e alguns novos, ainda pouco conhecido do público. 
                Esta mescla revela um impacto e convivências saudáveis entre as 
                distâncias e convergências de gerações distintas de escritores 
                brasileiros. O livro começa com o decano mineiro Affonso Ávila 
                (mais de 50 anos de poesia usando a sua velha máquina de datilografar), 
                e num exercício de objetividade jornalística e detalhamento crítico 
                observa a mudança na dedicatória feita pelo poeta a Carlos Drummond 
                de Andrade na edição inicial de Código de Minas (1969), substituída 
                por uma epígrafe de Cláudio Manoel da Costa, na de 1997. Se você 
                quiser saber porque o historiador, casado com a ensaísta e também 
                poeta Laís Corrêa de Araújo, é tão ávido pelo barroco mineiro 
                e a sua teoria sobre a lógica do erro leia o colóquio, um dos 
                pontos interessantes de Dez conversas. Em ordem alfabética mais 
                nove nomes compõem a listagem: Antônio Risério, Armando Freitas 
                Filho, Chacal, Edimilson de Almeida Pereira, Maria do Carmo Ferreira, 
                Millôr Fernandes, Ricardo Aleixo, Sebastião Nunes e um crítico 
                ferrenho do uso de metáforas na poesia, o falecido Sebastião Uchoa 
                Leite. 
                
                Numa das melhores entrevistas, o baiano Antônio Risério pondera 
                que o poeta tem que jogar, inteligentemente, com as tecnologias 
                do espírito. Sob a batuta intermitente, inventiva e implacável 
                do entrevistador, adentra num questionamento provocante em relação 
                à poesia concreta, sua linguagem construtivista e o fim do ciclo 
                histórico do verso. “A poesia concreta é uma coisa, os poetas 
                (que foram concretos) é outra. Quanto ao verso, façam-no os que 
                sabem fazê-lo”. Diante da internete e da pós-modernidade, 
                Risério que publicou em 1998 Ensaios sobre o Texto Poético em 
                Contexto Digital mobiliza todo um arsenal teórico que vai de Benjamim, 
                passando por Derrida, Haroldo de Campos, Macluhan e Pierre Levy 
                para articular um discurso maduro: “Nós não temos, no momento, 
                projeto claro de uma nova sociedade. Mas acho que, em conseqüência 
                disso, não devemos cair no extremo oposto. No extremo do ‘relativismo 
                permissivo’ de que fala Ernst Gellner. Ou nessa ‘histeria 
                da subjetividade’, que foi chamada de ‘pós-modernidade’. 
                Pra mim, a relatividade cultural não significa a aceitação passiva 
                de um carrossel de supostas ‘verdades’. Não. Significa 
                coragem intelectual para o diálogo entre culturas. Assim como, 
                no campo estético, não significa abolição de critérios. Essa bobagem 
                é apenas um álibi para os incompetentes. Podemos não ter um projeto 
                único, mas isto não significa abrir mãos da discussão objetiva 
                e rigorosa das coisas”. E vaticina novas exigências para 
                o poeta que se depara com a dimensão espaço-tempo na escrita e 
                no ambiente tecnológico: “Acho que o principal é que o poeta 
                não pense o computador como uma espécie de supermáquina datilográfica. 
                O computador é uma outra coisa. Há que investir poeticamente no 
                campo da computação gráfica, tirando partido das possibilidades 
                da nova tecnologia da mente, que alarga o horizonte do fazer, 
                no sentido da promoção de uma liberdade dimensional da linguagem. 
                A palavra eletrônica é uma palavra-evento. O poeta que souber 
                lidar com isso, vai se movimentar, obviamente, num novo universo 
                escritural”.
                
                Cariocas e Mineiros - Agora em 2004, o premiado poeta carioca 
                Armando Freitas Filho para comemorar os 40 anos de carreira lançou 
                a antologia Máquina de Escrever. Reconhecidamente influenciado 
                por Drummond, João Cabral, Bandeira e Gullar, Freitas Filho começou 
                com 23 anos lançando Palavras na década de 1950. Em Dez conversas 
                relata a convivência com Ana Cristina César, Drummond e Waly Salomão. 
                Aborda a questão do duplo cego, “a metáfora perfeita, pra 
                mim, da relação escritor/leitor. A gente escreve para ninguém 
                ou para todos, o que vem dar no mesmo. A gente não sabe se a droga 
                que a gente produz vai funcionar ou não, quem a engole, também”. 
                Eis uma entrevista que desnuda, por meio de perguntas incisivas, 
                aquilo que Marcelo Coelho observa na poesia de Freitas Filho: 
                o diagnóstico de uma poesia perturbada: “Minha poesia é 
                perturbada, a emissão de meu verso, melhor dizendo, é perturbada 
                como a minha fala: pois sou gago. Para me ouvir é preciso ter 
                paciência, para me ler idem, ibidem. Não faço assim porque quero: 
                faço assim porque não dá para fazer de outro jeito”. O exercício 
                do bom jornalismo caminha junto com a curiosidade. Vem a propósito, 
                de maneira afiada, sobre a indagação que o entrevistador faz ao 
                também carioca Chacal, 53 anos, sobre a poesia concreta x poesia 
                marginal: “Concretismo: dez em matemática. Dez em política. 
                Zero em Português. Poesia marginal: zero em português. Dez em 
                biologia. Zero em matemática”. Para um escritor que elege 
                a rima, a aliteração, a paranomásia (imagens sonoras), a metonímia 
                (imagens visuais) e a metáfora, com pitadas de sinestesias (mistura 
                de sensações), como a praia da composição poética e a máxima de 
                que “A Poesia não é para se viver, é para se escrever” 
                cabe saber a opinião sobre o que um poema falado “diz” 
                que o poema escrito, tipográfico, não pode dizer? “Talvez 
                a distância do rosto e seu retrato. A palavra, quando plena de 
                sentido, fica prosa, como diria o meu primo. E por isso não se 
                contenta em ficar chapada sobre o papel como um cachorro atropelado. 
                Ela quer inflar, viajar, ganhar outras dimensões. Quando o poeta 
                alça a voz, o sol fica vermelho de inveja porque sabe que é a 
                única energia que pode superá-lo em sua grandeza e calor”. 
                Chacal já publicou 13 livros, escreve periodicamente nos principais 
                jornais e revistas do país, faz letras com vários músicos. Criou 
                e dirige desde 1990 o Centro de Experimentações Poéticas – 
                CEP 20.000, um evento que reúne poetas e ouvintes mensalmente 
                no Rio. No livro, reitera e aponta a internete como um novo espaço 
                de disseminação, valorização e expressividade da poesia na contemporaneidade. 
                
                
                Um poeta bem mais novo, nascido em 1963, também se sobressai: 
                Edimilson de Almeida Pereira. Nascido e criado em Juiz de Fora, 
                Minas Gerais, companheiro do pai entregando roupas pela cidade 
                quando jovem, e pesquisador do lúdico no mundo dos sons, Pereira 
                pensa a poesia como uma confrontação entre a fala e a escrita. 
                No bate-papo, Fabrício Marques atenta para um fato marcante: o 
                ritmo e a oralidade, sintonizados e operados na sua freqüência 
                própria e original de Pereira no livro Zeosório Blues (2002). 
                Sob uma forte influência africana e defensor da poesia como um 
                ato criativo, lírico e universal, o juiz-forense deixa uma mensagem 
                que merece uma boa reflexão: “O poema é pequeno e pouco 
                ante a legião de injustiçados, estamos exaustos de ouvir dizer. 
                Mas não podemos estar cansados quando falta tanto para o ser humano 
                se cumprir e o poema ainda faz do mundo a sua pedra de amolar”. 
                Outro mineiro, nascido em 1938, natural de Cataguazes, é a única 
                mulher na lista: Maria do Carmo Ferreira. Embora inédita em livros, 
                publica poemas em jornais, suplementos e revistas literárias pelo 
                Brasil desde a década de 1960, incentivada na ocasião por Murilo 
                Rubião. Como observa Dez conversas, a poesia para “Carminha”, 
                não se dá à luz só por esforço e obediência, mas igualmente por 
                insistência, obstinação, vocação e existencialismo. “Nunca 
                corri atrás para publicar ou divulgar o que faço. Questão de insegurança 
                ou de temperamento? Acho que os dois. Tem uma canção tocada e 
                gravada por uma banda católica, com um verso que diz assim: ‘Você 
                nasceu para dar certo/por isso vá ficando esperto...’ Eu 
                sei que nunca ficarei esperta, levo minha vida lesa, lisa, louca. 
                Quanto a saber pra quê nasci, bem, deixo a resposta em aberto. 
                Não sei se nasci para ou por quê. Aliás, quem sabe?”
                
                O Site do Millôr - Outro decano na lista, 80 anos agora em 2004. 
                Outro carioca. Ele já publicou 32 livros. Intelectual, jornalista 
                e humorista reconhecido. Trabalhou nos principais veículos de 
                comunicação do país. No ano 2000, lançou o site (como faz questão 
                de grafar) “Millôr On-line” (www.millor.com.br). No 
                jornalismo impresso, trabalhou em A Cigarra, O Cruzeiro, O Pasquim, 
                Veja, Folha de S.Paulo, Jornal do Brasil, TVs e rádios. Um proficiente: 
                traduziu Shakespeare, Molière, poemas do israelense Yehuda Amichai 
                e ajudou a divulgar, na década de 1980, o nome do brasileiro Manoel 
                de Barros. Leitor voraz. Escritor de peças teatrais, haicais e 
                textos poéticos, denominados poemeu, poeminhas. Irreverente, iconoclasta 
                e aforista: “Quem não aprende a comer a alma das outras 
                pessoas não está com nada”.
                
                Mais um mineiro na lista da nova geração: o belo-horizontino Ricardo 
                Aleixo. Começou a publicar suas poesias na década de 1990. Aprendeu 
                a gostar de ler com a família, e escreveu o seu primeiro poema 
                com 17 anos. Autor de dois livros bem recebidos pela crítica: 
                Trívio (2001) e Máquina Zero (2004). Hoje, aos 44, diante de um 
                questionamento proposital de Fabrício Marques sobre o virtuosismo, 
                tem uma visão bem enérgica da poesia brasileira: “O que 
                predomina na poesia brasileira contemporânea é, ao contrário, 
                na maioria dos casos pura ostentação, típica desta mentalidade 
                noveau riche, que se contenta em macaquear modas literárias”.
                
                Sebastião Nunes, Tião Nunes, Sebastunes Nião, Sebunes Nastião, 
                Bastião Nu, Sabião Bestune, dentre outros nomes nasceu no dia 
                cinco de dezembro de 1938, em Bocaiúva, Norte de Minas Gerais. 
                Publicou 10 livros de poemas, à margem das grandes editoras. De 
                modo independente lançou nos anos de 1988/89 os dois volumes da 
                Antologia Mamaluca & Poesia Inédita, poesia experimental de 1968/1989. 
                Em 1996 publicou Sacanagem Pura: ensaios sacanas sobre publicidade 
                pela DuBolso, selo criado pelo autor. Defensor da “estética 
                da provocação”, também em 1996 editou um pseudo-Mais! Ameaçado 
                de processo pela Folha de S.Paulo, respondeu em carta-aberta, 
                endereçada ao jornal paulista e a mais de 300 escritores e jornalistas 
                brasileiros. O jornal silenciou. Sobre o fato, como ressalta Fabrício 
                Marques em Dez conversas, na época, o ensaísta Silviano Santiago 
                escreveu: “Sebastião Nunes apropriou-se do logotipo de conhecido 
                jornal paulista para dar e publicar uma ‘entrevista’ 
                que ele não consegue dar e publicar nos suplementos literários 
                prestigiosos. Tião Nunes, na ‘provinciana’ cidade 
                de Sabará, está fazendo a sua capina cultural, suplementando os 
                suplementos literários das ‘metrópoles’ brasileiras’’. 
                Nunes é um crítico ferrenho da concentração do poder, implementado 
                pela mídia: “Estamos sob a maior, mais ampla e mais duradoura 
                ditadura que já existiu: a dos meios de comunicação de massa, 
                especialmente rádio e Televisão”. 
                
                Completa a listagem o falecido poeta, premiado com dois jabutis, 
                e tradutor pernambucano Sebastião Uchoa Leite (1935-2003). Entre 
                as publicações destacam-se a coletânea Obra em Dobras (1988), 
                que reúne os seis primeiros livros escritos e a antologia de poemas 
                Contratextos (2001), em espanhol (tradução de Adolfo Montejo Navas). 
                A matéria de Uchoa Leite sempre foi a linguagem e suas atribulações: 
                “Quem não for capaz de apreciar paradoxos, jamais entenderá 
                à poesia”. Vale transcrever a pergunta feita por Fabrício 
                Marques e posterior resposta, numa observação estética relevante: 
                “Pode-se dizer que uma das singularidades de sua poesia 
                é a crítica às metáforas como recurso privilegiado da poesia, 
                na expressão de Duda Machado. Se você concorda, quando é que as 
                metáforas podem ter lugar nos poemas? “Acho, vagamente, 
                que a crítica às metáforas começou com João Cabral, logo nos seus 
                inícios. Se eu o fiz, apenas reiterei, e não julgo que seja uma 
                peculiaridade minha, mas de uma certa poética da minha época. 
                Exceto entre os neoclássicos e os neoparnasianos, que a cultivam 
                com zelo quase religioso, na poesia moderna e no pós-modernismo 
                lato sensu, a metáfora foi sempre uma entidade sob suspeita. Duda 
                Machado talvez hiperdimensione, generosamente, esse aspecto no 
                meu trabalho. Tudo não é questão de metáfora ou não-metáfora, 
                penso eu. Mas sim uma questão de articulação da linguagem. Ou 
                seja, da sintaxe poética, que joga com a disposição de tudo que 
                convém à imaginação poética: palavras, frases, imagens ou metáforas, 
                relações fonéticas, alusões semânticas, sentido e não-sentido, 
                etc. O resultado desse jogo é um bom ou um mau poema. E não é 
                aleatório. Pois, para que uma articulação funcione, não basta 
                ser ‘sensível’, é preciso atenção e percepção das 
                formas, sejam visuais ou lingüísticas”.
                
                Dez conversas é um livro maduro e consciente. Seu legado acrescenta 
                diálogos pertinentes sobre a poesia e os poetas brasileiros neste 
                mundo de culturas híbridas. Um registro inteligente e resgate 
                da arte de entrevistar com destemor, respeito e paciência. Um 
                exercício sério, revelador. Uma possibilidade concreta de ver 
                bem perto lado a lado a liberdade e a criatividade. Uma intercessão 
                entre a poesia e o campo da comunicação social. Uma confissão 
                democrática. Uma aliteração Inventiva e valorosa: um jornalismo 
                literário de primeira qualidade. 
                
                
                * José Aloise Bahia (Belo Horizonte/MG) é jornalista, ensaísta, 
                cronista, escritor e poeta. Graduado em comunicação social e pós-graduado 
                em jornalismo contemporâneo. Autor de Pavios Curtos (no prelo 
                pela anomelivros). josealoise@aol.com
                 
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