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                rei do cangaço
                
                Lampião nasceu das contradições 
                e conflitos da terra, da violência do campo imposta pelos 
                coronéis latifundiários, políticos corruptos 
                e do clero aliado da aristocracia sertaneja e da burguesia litorânea. 
                Eternizou-se como mito da cultura popular. Virou lenda no Brasil 
                de Sul a Norte, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. 
                Influenciou a música popular nordestina. Apimentou os acordes 
                de Luiz Gonzaga e de centenas de sanfoneiros, violeiros, repentistas 
                e cordelistas. Seu sangue corre nas veias do xaxado (dança 
                dos gangaceiros), no xote, no baião e no forró. 
                
                É Lamp, é Lamp, é Lamp. É Lamp 
                é Lampião. Seu nome é Virgulino, o apelido 
                é Lampião. Este é o hino consagrado 
                ao rei do cangaço pelo Brasil. Um canto que eclode nas 
                caatingas, no agreste, no Raso da Catarina, na Serra do Apodi, 
                nos cariris, Serra Talhada, tabuleiros, lugares por onde passou 
                o célebre cangaceiro. 
                Virgulino Ferreira da Silva nasceu em Vila Bela, atual Serra Talhada 
                 alto sertão pernambucano  no ano de 1897. 
                Ano trágico do massacre de Canudos, onde foram assassinados 
                milhares de camponeses. Da estirpe de Antônio Conselheiro, 
                o famoso beato e líder político-religioso que inspirou 
                Os Sertões, obra-prima de Euclides da Cunha, Lampião 
                foi cangaceiro, uma categoria acima de jagunço. Com ele, 
                muitos jagunços  vassalos dos coronéis  
                ascenderam à posição de cangaceiro que era 
                símbolo de independência e individualidade. O soldo 
                do cangaceiro dependia do que se conseguia em saques, sequestros, 
                assaltos a fazendas e cidades. Lampião era generoso e bom 
                pagador. Franqueava aos cabras do bando ações individuais 
                que rendiam alguma remuneração. 
                O reino de Lampião durou de 1914 a 1938. Atraiu muitos 
                jagunços e coiteiros de todo o Nordeste numa época 
                crítica, sem muitas opções de trabalho. Calcula-se 
                que seu grupo tinha em torno de 120 membros. 
                Lampião viveu todos os conflitos de seu tempo quando o 
                sítio de seu pai, José Ferreira, em Vila Bela, foi 
                invadido pelo fazendeiro João Nogueira e seus capangas. 
                Invadiram as terras dos Ferreiras, cortaram orelhas dos animais. 
                Fizeram emboscadas e trapaças, em 1911. Os Ferreiras fugiram 
                para um sítio no interior de Alagoas e se desentenderam 
                com o subdelegado da região que invadiu o local e matou 
                o pai de Lampião. 
                Aos 23 anos, após o assassinato do pai, Lampião 
                tornou-se cangaceiro. Levou consigo os irmãos Ezequiel, 
                Antônio e Livino. O apelido de Lampião foi dado pelos 
                homens do bando de Sinhô Pereira que iniciou o jovem Virgulino 
                no cangaço. Reza a lenda que Virgulino atirava muito bem 
                e que o seu fuzil parecia iluminado. Atribui-se a ele a frase: 
                Meu fuzil não nega fogo. A frase foi retrucada 
                por outro cangaceiro que disse: Então não é 
                fuzil, é lampião. O apelido pegou e virou 
                mito no sertão de Deus-dará. Lampião herdou 
                o comando do bando de Sinhô Pereira aos 25 anos. A partir 
                de 1926 algumas mulheres foram incorporadas ao bando. Lampião 
                conheceu Maria Bonita em 1929, então mulher de um sapateiro. 
                Fez a corte à bela Maria que abandonou o marido e optou 
                pelo cangaço. 
                A caçada a Lampião e seu bando terminou no dia 12 
                de agosto de 1938. O cangaceiro foi morto aos 40 anos, a 3 quilômetros 
                do Rio São Francisco, na grota da fazenda Angico. Época 
                em que o rei do cangaço estava distraído, preocupado 
                com a sua Maria Bonita que vivia o drama da tuberculose. A tropa 
                do tenente João Bezerra recebeu o serviço do coiteiro 
                de Lampião Pedro de Cândido que, segundo consta, 
                teria levado bebida envenenada para os cangaceiros. Não 
                houve luta. Os homens estavam bêbados e dormentes. Onze 
                cangaceiros foram mortos, incluindo Lampião e Maria Bonita. 
                Vinte e quatro cangaceiros fugiram pelo sertão. Acabou-se, 
                aí, o reinado de Lampião. Mas a lenda continua. 
                
              
                Gustavo Dourado